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O que têm em comum o Facebook e o Pai Natal?

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Vivemos numa sociedade fascinada pelo mundo digital. As chamadas novas tecnologias movem o mundo e mobilizam investimentos astronómicos, tanto públicos como privados, que acreditam piamente no seu potencial transformador.

Se é certo que este potencial existe, convém não esquecer que, por muito que as tecnologias evoluam, continuam presas aos seus utilizadores, esses velhinhos seres humanos que pouco ou nada mudaram nas últimas dezenas ou mesmo centenas de milhares de anos.

É por isso intrigante, surpreendente e sobretudo preocupante o pouco relevo que a literacia digital assume neste contexto. Parecemos partir do pressuposto que o ser humano, de forma automática e imediata, se adapta à constante evolução tecnológica e dela tira o melhor partido possível.

Entre o Pai Natal e o Coelhinho da Páscoa

Também podemos acreditar no Pai Natal e no Coelhinho da Páscoa, mas não é por isso que eles se tornam mais reais. Debates como o que recentemente envolveu as práticas adoptadas pelo Facebook para gerir a interação entre os seus utilizadores parecem esquecer um vetor fundamental da equação: as pessoas que usam esta rede social.

Se é certo que o facebook e outras plataformas similares deveriam ter a responsabilidade de moderar a sua própria ambição de crescimento em benefício da boa convivência cívica, a expectativa de que o façam é no mínimo contraditória num capitalismo tardio que promove precisamente o contrário.

Afinal, a divina mão invisível do mercado haverá de solucionar todos os desafios e nada deve deter o inexorável caminho de crescimento interminável que todos ambicionamos (e idolatramos).

O presente no sapatinho

Resta então debater o papel que os próprios cidadãos devem desempenhar neste processo. Devemos remeter-nos ao papel passivo da criança que aguarda ansiosamente pelo presente no sapatinho e se arrisca a receber um bocado de carvão, ou temos que assumir a liderança e privilegiar conteúdos de qualidade que promovam um debate informado?

Não acredito que o fascínio humano pelo escândalo e a ofensa no mundo digital seja uma fatalidade derivada da omnipresente «natureza humana». Se há poucos séculos as pessoas se deleitavam a assistir a execuções em praça pública, hoje já poucos considerariam esta «diversão» um bom programa de família para o fim-de-semana.

Podemos, e devemos, evoluir, crescer, adaptar-nos e melhorar sempre, pois só assim construímos sociedades mais justas, equilibradas e democráticas. E, para termos conteúdos de qualidade na internet, temos que aprender a identificá-los e a valorizá-los.

Se a desinformação não tiver procura, a oferta irá reduzir e esta é uma boa forma de atacar o problema. Pelo menos, é uma das formas possíveis entre outras, como a supervisão cívica e a censura pública perante práticas digitais pouco éticas.

Termino este artigo com uma citação do projeto DIGIT-AL sobre a educação para a democracia digital. Não diz tudo, mas diz muita coisa sobre um dos desafios mais importantes dos nossos dias:

A digitalização é uma parte essencial das nossas vidas em todas as dimensões. Muitas pessoas pensam que é um processo tecnológico, ou seja, que envolve principalmente servidores, algoritmos, Internet e semelhantes. Mas é difícil separar a digitalização de quase todas as atividades nas nossas vidas.

Quando fazemos compras online estamos online ou estamos às compras?

Quando jogamos jogos de computador estamos a jogar ou estamos no computador?

E quando atuamos nas redes sociais, estamos ao mesmo tempo a socializar e em atividade digital?

 Além disso, o nosso sistema de saúde já está digitalizado, a poluição do planeta é, cada vez mais, causada pela tecnologia digital e atividades como andar de carro ou colaborar na sociedade civil são cada vez mais facilitadas pela tecnologia digital.

Camila Rodrigues – Administradora das Mulheres à Obra

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